Busca obsessiva pela magreza tem efeitos colaterais indesejáveis
- Marília Campos
- 10 de jul. de 2023
- 5 min de leitura
Sintomas como envelhecimento da aparência, queda capilar e piora da autoestima são comuns, diz médica nutróloga
Depois de anos flertando com o body positive, em um movimento de autoaceitação, estamos de volta à cultura da magreza: nos desfiles de moda, modelos mais magras do que nunca; nas redes sociais, um bombardeio de dietas emagrecedoras mirabolantes e estratégias de jejuns intermitentes que mais parecem tortura; nas gôndolas das farmácias, um medicamento para diabetes (semaglutina) some pelo uso indiscriminado e sem orientação para o emagrecimento.
“A idealização do corpo magro como referência estética é um fenômeno crescente no mundo. Historicamente, a indústria da moda impõe um padrão de corpo magro para os modelos que carregam suas coleções, muito abaixo do que é admissível como normalidade. Logicamente uma minoria tem naturalmente esse biotipo, mas certamente a maior parte das modelos femininas, no mundo, só atinge essa forma às custas de estratégias que trazem muitos impactos negativos à saúde física e mental. O grande problema, do ponto de vista médico, é que essas modelos vão estampar suas imagens em todas as mídias, como ideal de beleza, sucesso e luxo. Um padrão inatingível para a maioria da população mundial, potencializado nas redes sociais e que pode ter consequências desastrosas, como o aumento na prevalência de distúrbios emocionais e transtornos alimentares, particularmente nas gerações mais novas”, explica a médica nutróloga Dra. Marcella Garcez, diretora e professora da Associação Brasileira de Nutrologia (ABRAN). “Além disso, todas essas estratégias seguidas sem orientação geralmente produzem um efeito estético que piora a autoestima dos pacientes, já que essas dietas insustentáveis e o uso de medicamentos sem orientação podem envelhecer a pele e acelerar a queda capilar”, acrescenta a médica.
Segundo a médica nutróloga, é positivo que uma pessoa queira melhorar o seu corpo, emagrecendo, ganhando músculos e até fazendo procedimentos estéticos, mas isso deve ser sempre feito com auxílio de um profissional. “As dietas restritivas podem provocar sérios desequilíbrios no organismo, que vão desde os hormônios responsáveis pela regulação do balanço energético, até desordens emocionais e descontrole na ingestão alimentar. Se esses sintomas forem intensos e frequentes, aumenta o risco para o desenvolvimento de transtornos alimentares tipo bulimia, anorexia e compulsão alimentar periódica, relacionados às práticas restritivas de alimentos autoimpostas por preocupações exageradas com o peso corporal”, explica a médica.
Aceleração do envelhecimento
De uma forma geral, qualquer emagrecimento repentino não intencional, sem causa emocional, que conte com perda ponderal de mais de 10% do peso corporal, deve ter acompanhamento médico, pois pode ser consequência de estados patológicos. Se a perda de peso rápida for intencional, em virtude da adoção de uma dieta muito restritiva com o objetivo de emagrecer, principalmente no caso de uso de medicamentos sem prescrição médica, ao invés de eliminar gordura, podem levar à perda de massa muscular e líquidos do corpo, que vai culminar com o envelhecimento da aparência – afinal, perde-se gordura e água no corpo todo e não só nas regiões de ‘dobrinhas’. “A perda de gordura facial em suas várias formas, desde o surgimento sutil de contornos silenciosos até o início chocante de depressões severas, tem impactos futuros importantes. A gordura facial contribui para uma aparência saudável e jovem, no mínimo, ela dá volume e estrutura à pele, evitando rugas, e esconde a arquitetura subjacente da face – os ligamentos e depressões ósseas que podem parecer velhas quando expostas”, explica o Dr. Paolo Rubez, cirurgião plástico, membro da BAPS (Brazilian Association of Plastic Surgeons) e da Sociedade Americana de Cirurgia Plástica (ASPS). “Com o processo de envelhecimento, os compartimentos de gordura que compõem as bochechas são absorvidos pelo organismo, o que diminui o seu volume, favorecendo o surgimento de flacidez no terço inferior da face, além de conferir um aspecto esquelético e envelhecido ao rosto”, diz a cirurgiã plástica Dra. Beatriz Lassance, membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. Ou seja, o emagrecimento em dietas restritivas demais só aumenta o risco de acelerar um processo natural de envelhecimento.
Além disso, existe o problema das carências nutricionais. Uma alimentação com déficit calórico muito expressivo (ou seja, quando as calorias ingeridas são extremamente menores que a taxa metabólica) trará resultados para o emagrecimento, mas poderá causar sérios problemas ao corpo. “Além do déficit calórico, o déficit proteico e a pouca ingestão de água são os fatores alimentares que mais rapidamente impactam negativamente as estruturas da pele, porém nutrientes importantes como vitaminas, minerais e antioxidantes são essenciais para a manutenção da saúde cutânea, portanto não há pele saudável sem alimentação equilibrada”, afirma a Dra. Marcella. Trocando em miúdos? Quando você escolhe pela escassez para emagrecer, está deixando seu organismo sem os nutrientes necessários para manter a beleza da sua pele, cabelo e unhas. “Automaticamente, tendemos a ficar com a aparência mais envelhecida, principalmente pela redução do aporte proteico que compromete a síntese de fibras colágenas para manutenção e reposição de estruturas dérmicas, isso sem falar nas consequências negativas da perda de massa magra, que leva à flacidez e a sinais de envelhecimento acelerado não apenas na face, mas no corpo como um todo”, diz a nutróloga.
Queda de cabelo
As carências de vitaminas, minerais, proteínas, gorduras e carboidratos de boa qualidade também impactam na saúde dos fios e do couro cabeludo, segundo a dermatologista Dra. Lilian Brasileiro, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia. "O cabelo é composto principalmente de proteínas, portanto, incluir quantidades adequadas em sua dieta é vital para o crescimento do cabelo. Alimentos que são boas fontes de proteínas são peixe, frango, carne magra, ovos, feijão, quinoa, tofu e leguminosas. O ovo, por exemplo, traz proteínas, ácidos graxos, aminoácidos essenciais, vitaminas e minerais como zinco, selênio e ferro. Esses micronutrientes são envolvidos nos processos de formação da fibra capilar e de multiplicação das células da raiz do cabelo, facilitando o processo. É por isso que o consumo de ovos contribui para sua saúde capilar”, diz a Dra. Lilian. Aproximadamente 85% do cabelo é formado de queratina, que é uma proteína, e por ser um tecido de excreção, é formado de aminoácidos sobressalentes para essa função. “Se não houver sobra de aminoácidos, não há boa síntese de queratina. Além disso, minerais metálicos como ferro e cobre além de vitaminas do complexo B como a biotina participam da manutenção da saúde capilar”, diz a nutróloga.
Piora da autoestima
Um dos problemas das dietas restritivas é o efeito sanfona. As tentativas em vão de emagrecer e encaixar-se no padrão estético magro, somadas às alterações da aparência provocadas por carências nutricionais, contribuem para a piora da autoestima e uma visão de distorções com o próprio corpo. “A imagem corporal negativa é uma das principais causas de transtornos alimentares, como anorexia e bulimia; sabemos por estudos científicos que existem consequências sérias para as restrições alimentares severas, que contribuem para uma série de problemas graves de saúde mental”, afirma a médica nutróloga. Além dos distúrbios alimentares e de imagem, outra preocupação médica é com relação ao reforço do sentimento de culpa, que pode retroalimentar os sentimentos de ansiedade e tristeza. “O mais importante é buscar um auxílio médico, que oferecerá uma ajuda baseada no contexto do paciente”, finaliza a nutróloga.
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